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De ponta cabeça

Atualizado: 28 de jan. de 2019


Um pequeno preâmbulo:


Começa nesse texto uma nova série, na qual revisito processos vividos no passado. Por cerca de um ano, entre 2011 e 2012 escrevi um blog chamado "Quando o Mar se Abre", no qual compartilhei sobre os aprendizados vividos no pré-durante-pós período sabático. Passei 10 meses fazendo trabalho voluntário em Israel e Bali, em busca de mim mesma. Foi um tempo muito transformador e hoje vejo que muito do que hoje vivo e faço já estava presente ali.


São textos escritos enquanto eu viajava e me descobria e ocupam um lugar sagrado no meu coração, não só pelas memórias vividas, mas pelos muitos aprendizados colhidos.


Escolhi começar com um dos primeiros textos, escritos poucos dias depois de sair do Brasil e chegar em Israel. Eu estava em Tel-Aviv, me ambientando antes de começar a trabalhar com sustentabilidade em comunidades agrícolas (kibbutzim) no deserto.

 


Publicado em 8/5/2011


Sempre tive um medo inexplicável de fazer sirshasana, aquela postura do yoga em que você fica de ponta cabeça, com o peso do corpo sobre os antebraços e o cucuruto. Pratico yoga há 5 anos e nunca consegui completar a porcaria da postura. Ou fazia apoiada na parede, com uma frustração inenarrável ou simplesmente não fazia. Tudo bem que meu problema na cervical não ajuda, mas poxa… 5 anos de prática, né? Já é mais que hora de aprender e perder o medo.


Medo de que, afinal? De cair? De me machucar? Pagar mico? Medo de conseguir? Sei lá…


Hoje acordei cedo, pra ver se me adaptava ao fuso horário daqui (tenho ficado meeeega sem sono a noite). Sai com meu tapetinho de yoga nas costas, rumo a praia (a 5 minutos daqui, ueba!), pra tentar uma prática pessoal.  Nunca tive disciplina pra isso, minha atenção acaba indo pra linda criança correndo, pro machucadinho na minha perna, pra vontade de fazer xixi, pro chip de celular que preciso comprar ou pro latkes delicioso que comi ontem.


Enfim…Desci as escadas e virei a direita. Dei de cara com uma moça com o mesmo tapetinho nas costas. A segui por 3 segundos e ela entrou no estúdio de yoga do lado da minha casa. Do lado mesmo.


Quando me vi, estava fazendo aula de yoga em hebraico! Lembrei de palavras esquecidas, tipo iadaim (mãos) e pés, que já esqueci de novo como se fala. (Preciso de um caderninho pra anotar palavras novas).


Saindo de lá, precisava dar uma meditada. Ainda tava no jet lag, meio errada, e senti que estava perdendo a alegria que sentia de antes de vir. Andei até a praia e parei num lindo parque. Sentei, fiz meu reiki, tentei meditar, mas não deu. Abri os olhos e que coisa linda – prana, muito prana (que aliás, é o nome do estúdio de yoga).


O que é prana? É como os hindus chamam a energia cósmica do universo (pelo menos a parte que está acessível a nossa dimensão). Os chineses chamam de de Chi e os espíritas de Energia imanente.

São minúsculas bolinhas brancas, tipo purpurina. Aparecem por alguns segundos, deixando um traço e voltam a desaparecer. Todas as vezes que vi prana com tanta facilidade estava num estado de espírito livre, leve, solto e grato. E aí a gratidão voltou. Como um delicioso soco na nuca. E o choro também.


Como chorei, de soluçar. Choro de libertação, de agradecimento, de felicidade, de êxtase. Eu comecei a viagem da minha vida! Estou aqui! Agora! Tem como não chorar?


Depois do prana e do choro, me vi dançando loucamente no gramado. Tentando fazer estrelas e bananeiras, como se tivesse 5 anos e tivesse acabado de sair da 1ª aula de ginástica olímpica.


Pronto Carol, chegou a hora.


Cotovelos no chão, na distância dos ombros. Dedos entrelaçados, como se tivesse uma maçã (ou tapuach) entre as mãos. Topo da cabeça no chão, joelhos no chão, força nos antebraços, trapézio leve, omoplatas encaixadas e olhar sereno. Tira os joelhos do chão, vem trazendo os pés pra perto das mãos, até a coluna ficar ereta. Força no abdômen, traz uma perna, sustenta. Traz a outra, fica. Fica?


Nada! Cai.


Tenta de novo. Cai.


De novo. Cai.


Mais uma vez… Nada.


Carol querida, você está sozinha, num país estranho, numa língua estranha. Você vai cair inúmeras vezes nesse próximo ano. Quedas que muito provavelmente vão doer muito mais do que essa possível quedinha de agora. Aprenda a cair! Caia com tranqüilidade e com a certeza de que consegue se levantar.


Tenta uma última vez.


Shirshasana completo.


Que delícia ver as coisas sob outro ângulo, de cabeça pra baixo. Com a insustentável leveza do ser.


 

O QUE SIGO APRENDENDO COM ESSA EXPERIÊNCIA:

O corpo reflete nossos aprendizados e nossos aprendizados se refletem em nosso corpo. Mesmo dominando a técnica da postura, sabendo mentalmente exatamente o que precisava fazer e o que precisava estar encaixado, meu corpo não obedecia os comandos. Porque? Porque a mente não deixava. Medo de sair do controle, de ver as coisas por um outro ângulo. Não era falta de técnica nem de força, era por excesso de mente controladora.


Ás vezes, sabemos tanto o que precisa ser feito que não fazemos. Há de se sair do mental e ir pra experiência.


E, se cairmos, ótimo. Descobrimos que não sabíamos tudo sobre aquela situação.


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