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Como fazer o que gosto virar trabalho?

Atualizado: 28 de ago. de 2019


crédito: Luiza Tozzi


Recebi essa pergunta:


Meu desafio atual é como fazer o que gosto virar trabalho. E como identificar o que gosto com potencial ativo para isso. 


Dentro de uma carreira muito generalista, em que passei a vida toda em uma profissão, minhas experiências me trouxeram muitas certezas sobre o que já fiz e não quero fazer, mas muitas dúvidas sobre se me encaixo em outros ambientes ou outras tarefas ainda dentro da minha área de atuação (comunicação e marketing) ou se meu espaço não está mais por aí. 

Tenho dificuldades em imaginar o meu ambiente, o meu dia a dia, se ele existe, de que forma ele materializa? Ou se a mudança deve ser maior, desconstruir a carreira para construir uma nova opção para mim. 

Porque aqui não há mais o que buscar... 

- Patrícia 


Patricia, te agradeço pela abertura e convite pra questionamentos por aqui. Dei meu melhor pra trazer reflexões que acho que podem apoiar a você e pra quem mais está sentindo a necessidade de transformação, sem clareza de pra onde ir. É um desafio trazer percepções sem me aprofundar mais no momento específico que as pessoas estão vivendo, busquei trazer pontos que possam ampliar a auto-percepção coletivamente.


Vamos lá?


Imagina: você está um momento desafiador, sabe que do jeito que está não vai mais rolar, quer muito transformar a realidade que vive, mas… como?


É bem comum buscarmos respostas a partir dos nossos saberes racionais.


Aí mora um perigo. 


Quando das mudanças de rumo e dos novos caminhos, a mente pode não ser nossa melhor amiga. Ela lida melhor com previsibilidade do que com o não-saber. Fica desbaratinada quando reconhece que não sabe e quer pular pra nova resposta, em sua dificuldades de sustentar o vazio do ainda-não-sei.


Repara como queremos as respostas a partir da mente, agora-já: trabalho na minha área ou em outras? Gosto disso ou daquilo? A mudança é pontual ou é uma desconstrução maior? A gente fica querendo saber o que vai acontecer antes que algo aconteça. Fica querendo prever como a transformação vai se dar. Só que não é da natureza da mudança a previsibilidade.


Dessa perguntação, quem entra em cena? A confusão e seu papel de garantir que a gente não saia do lugar e não precise enfrentar os desafios da imprevisibilidade e do não-controle.


A confusão é uma outra faceta do controle, que quer as respostas certas e garantidas. Se não estivéssemos em busca de respostas definitivas, não haveria confusão.


Se você se vê nesse momento, estou te convidando para dissolver a confusão ao adentrar o espaço do não saber.


Confuso isso?


Tenta entender com o corpo: estou te convidando para dissolver a confusãoao adentrar o espaço do não saber.


Deu pra assimilar melhor?

É tanta pressão pra saber e pra ter as respostas que perdemos a potência do não-saber, do espaço vazio, de sustentar a pergunta certa.


Ao nos sentirmos afogados na situação atual, na pressa de encontrar uma margem segura, ficamos obstinados pelas respostas. Corremos para a primeira margem disponível, perdendo a potência de seguir no fluxo do rio até chegar à margem mais apropriada pro momento. 


A mente quer margem rápido. O corpo tem segurança suficiente pra ficar na água mais um tempo.

É necessário coragem para ficar com a pergunta sem querer correr pra resposta. SIlenciar, respirar, meditar para abrir espaço para a resposta emergir. E aí as respostas vão chegando como se sempre estivessem estado aqui, porque estavam. Nós é que fomos deixando cair o que nos distanciava delas: o desejo de garantia, o medo de descobrir e precisar fazer o que pede para ser feito, o prazer da reclamação, a identificação com o que fizemos e quem fomos até hoje, a vontade de ser admirado a todo custo.


Sai da confusão e assume o risco. É libertador.


A resposta está dentro de você. Mas você está distante. Volta pro corpo e respira. Experimenta como é permitir-se saber.


Quando eu tirei uma pausa para esclarecer internamente como queria seguir com minha vida, a principal pergunta era “o que vou fazer profissionalmente?”. Não fazia ideia e estava disponível pra uma reinvenção total. Saí do Brasil por 10 meses, com uma certeza no meu corpo: vou escrever sobre a experiência. Sempre amei escrever e não estava dando vazão a esse prazer. O blog que comecei no pré-viagem era um projeto pessoal, sem grandes pretensões. E eu tinha tanto prazer escrevendo ali...


Foi dele que veio o primeiro trabalho remunerado depois do sabático, escrevendo como jornalista freelancer pra revista Vida Simples. O convite para dar aulas sobre inteligência emocional no Ensino Médio também veio de uma pessoa lendo o blog, assim como o café que resultou na Casa Sou.l, empresa que abri em 2013, onde aprendi muito do que sei sobre empreender, facilitar, anfitriar, Ser. 


Foi o blog. Algo despretencioso, que surgiu de uma vontade “boba”. 


A gente não sabe onde o chamado do nosso corpo pode nos levar. Mas precisa aprender a confiar nele.


É no corpo que habitam as respostas mais certeiras. A mente vai vir para servir o corpo. Alguns falam intuição, eu gosto de chamar a intuição de corpo, porque muitas vezes nossa mente sorrateira usa a voz da intuição pra nos empurrar pra busca de garantias.


Então traz a atenção pro corpo. Atenção plena pro corpo. O que ele de diz a cada momento. Como ele se sente a cada instante. Comer com atenção plena no sabor, na textura, na temperatura. Tomar banho sentindo a água, os cheiros e sensações. Respirar percebendo o ar que entra e sai. Só isso e tudo isso. Essa prática vai te ajudar a estar consciente do que está vivo em você - corpo, mente, pensamentos e emoções – tudo ao mesmo tempo.


E, aos poucos, as respostas vão emergindo nos momentos mais e menos esperados, com as vozes mais e menos claras. Às vezes como um sussurro poético. Outras, com um chamado firme. Com uma sensação de animação quando caminhamos em direção a algo que vivifica, ou com enjôo quando nos direcionamos a algo pouco virtuoso pro momento. Como uma aparição cristalina ou pistas turvas pra que a gente vá montando o caminho aos poucos.


E aí, quando vier o sussurro ou o comando, experimenta ir nessa direção. E novamente, observa, contempla, escuta a si mesmx e ao entorno. Observa o que se manifesta como quem testemunha em silêncio o vôo de um pássaro fazendo mover as folhas da árvore.


Deixe a vida se apresentar pra você. Se mova em direção ao chamado que ela te faz e escute, acima de tudo, sua curiosidade.


Gosto muito de uma história da Elizabeth Gilbert, autora de “Comer, Rezar e Amar. Ela estava passando um tempo na casa dos pais, se apaixonando pela jardinagem. Observou seu encantamento recente pelas plantas e foi seguindo a curiosidade. Leu muitas coisas, colocou muito a mão na terra, até que se deparou com o papel das mulheres na jardinagem e na história natural nos Estados Unidos no século 19. A curiosidade a levou a pesquisar mais e mais e, quando viu, tinha pronto em seu coração seu novo livro, “A Assinatura de Todas as Coisas”, sobre uma botânica no século 19. Elizabeth recomenda: esqueça a paixão, foque na curiosidade. Eu gosto desse chamado, porque ele tira a gente da pressão pela grandiosidade da paixão e nos traz para a leveza e brincadeira da curiosidade.


Não tem uma fórmula. Tem auto-observação e contemplação. Tem conhecer seu próprio corpo.


Desse lugar de sustentar a pergunta e observar-se no corpo, algumas perguntas podem apoiar a clareza do próximo movimento a se manifestar. 


Cuidado ao se relacionar com essas perguntas, para que as respostas não venham exclusivamente da mente. Deixe seu corpo responder. Então, antes de começar, te convido a experimentar uma respiração específica que vai te apoiar a silenciar a mente e adentrar o inconsciente e o corpo.


Inspira em 5 tempos e expira em 5 tempos, marcando cada um desses tempos com uma pausa na respiração. Ou seja: inspira curtinho e pausa por 5 vezes e depois expira curtinho e pausa por mais 5, fazendo esse ciclo por no mínimo 10 vezes.


Agora, responda:

Em que momentos me senti mais vivx na minha vida? Qual foi o período na minha vida em que me senti mais criativx?O que ativa minha curiosidade nesse momento atual?O que é incrivelmente fácil para mim?O que gosto sobre o que faço hoje?O que meu coração diz que eu devia estar fazendo da minha vida?Se eu voltasse a estudar, o que estudaria?O que é inegociável na minha vida hoje? Do que não abro mão?


Desse coletivo de respostas, insights podem se manifestar.


Outra coisa que me ajuda, além de meditar e fazer páginas matinais todos os dias (leia aqui mais sobre isso) é experimentar novas coisas. Vai pra rua, faz novos cursos, conversa com outro tipo de gente, leia outros livros, caminhe por outras ruas, receba novos estímulos e perceba o que ativa a vida dentro de você.


E lembre: esperar que os sinos toquem alto pode estar te distanciando de reconhecer onde os sinais já estão soando. 

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